O ACIDENTE AÉREO QUE EU PRESENCIEI!!!
MEU PAI já tinha uma sociedade numa pequena farmácia na Vila da Lapa do Pamplona, com o Sr. Gregório Santiago, proprietário de uma grande farmácia na cidade de Paracatu. Convencido por esse seu sócio, resolveu se mudar para Unaí, atraído por uma onda desenvolvimentista da região, onde as terras agricultáveis - culturas de beira rios - eram abundantes e era visível o progresso rápido da região. Ali se estabeleceriam com uma farmácia de porte maior e, com absoluta certeza, o sucesso comercial seria garantido.
NO ENTANTO, as dez horas previstas para todo o trajeto, foi consumido somente até ao meio do caminho, a cidade de Paracatu. A chuvarada intermitente não permitia o veículo trafegar normalmente e de atoleiro em atoleiro, conseguimos, à duras penas, chegar a Paracatu.
AS CHUVAS não deram tréguas. Meu pai se viu obrigado a alugar uma casa e, assim, ficamos moradores de Paracatu por aproximadamente trinta dias, até que pudéssemos seguir a viagem programada para Unaí, nas barrancas do Rio Preto.
PARA nós, a criançada, tudo era festa. Na época minha mãe já tinha os seus sete filhos. Ia desde o Vanderlei com dois anos, até a Ireni, a mais velha, com treze anos de idade. As novidades se sucediam a cada dia, pois procurávamos conhecer a vetusta cidade de Paracatu, admirando toda aquela arquitetura diferenciada de tudo o que jamais tínhamos visto, pois além da pequena Vila da Lapa nada conhecíamos.
NAQUELES tempos, com não poderia ser diferente, o meio de transporte mais eficiente, era o aéreo. Muito comum a gente ouvir o ronco dos pequenos aviões cortando os ares e nós não cansávamos de ficar olhando os pequenos aparelhos sobrevoando a cidade. Era tudo novidades.
NUMA MANHÃ, o caminhoneiro que iria nos transportar de Paracatu a Unaí, cujo nome só me lembro do apelido, TIM, nos convidou pra ir até ao Aeródromo – todos chamam de aeroporto -, para assistirmos a chegada e a partida dos aviões, ONTAS, da Empresa Aérea chamada IMPERIAL, que fazia o transporte regular de passageiros na região do Noroeste Mineiro.
ESSES aviões consistiam em aparelhos de pequeno porte, que conduziam apenas três passageiros, além do piloto, Me lembro bem que era um aviãozinho bonito, com as asas presas na parte inferior, próximo a sua barriga, e com as pontas suspensas até a altura da cabine de comando. Não sei como são classificados esses aparelhos e nem quem os fabricava.
SUBIMOS na carroceria do seu caminhão e fomos para o aeródromo, que ficava na região do Amoreiras. Mesmo ali onde, mais tarde foi construído o prado, local de corridas de cavalos do Jockey Clube.
O AERÓDROMO era cercado por cercas de arame farpado, de onde as pessoas ficavam a admirar os aparelhos taxiando no piso de chão batido da pista de pouso e decolagem, apreciando o desembarque e o embarque dos passageiros.
NESSE DIA eram em número de três, os aviões.
OS PASSAGEIROS embarcaram com as suas respectivas bagagens – normalmente minguadas -, devido ao peso. Os dois primeiros aviões, após os procedimentos técnicos, se arremeteram numa decolagem perfeita e se puseram a circular em torno do aeródromo, na espera da terceira decolagem, para juntos partirem rumo a Belo Horizonte, o destino final daqueles voos.
ESSA terceira aeronave partiu em busca da velocidade ideal para a decolagem, mas o piloto, por qual motivo não se sabe, abortou esse procedimento, preferindo mudar a direção, talvez em razão do direcionamento da biruta, que indicava um vento ideal para que arremetesse.
E LÁ veio o aparelho com todo o motor que lhe foi dado. E, quando se aproximava do maior número de pessoas curiosas, assistindo aquele “espetáculo”, o avião conseguiu sair do solo e ganhar uma altura aproximada de uns trinta metros, quando perdeu forças e veio de bico em direção ao solo. Isso quase defronte onde estávamos, sempre juntos ao TIM. Recordo com nitidez de quase setenta anos passados, que o aparelho balançou pra cair no seu normal, mas infelizmente caiu de costas, levando juntos os seus três passageiros e o único tripulante, o seu piloto.
NESSA hora deu-se o início da personificação do meu maior ÍDOLO de todos os tempos, o TIM, o caminhoneiro que nos levou para assistir aquela tragédia.
NO QUE o avião bateu de costas, ele que era um homem de cerca de um metro e oitenta de altura, forte e voluntarioso, arrancou do chão, com violência, uma das estacas da cerca de arame farpado, livrando-a das suas arestas e dirigiu-se determinado para o local, onde o avião estava caído. Sem se dar conta de que o aparelho começava a fumegar, sinal de que algo pior estaria para acontecer, ele arrebentou as portas e os vidros do aparelho com aquela estaca e foi retirando os passageiros de dentro do pequeno avião. Quando conseguiu retirar o último, que não consigo precisar qual deles, o aparelho explodiu em chamas, ficando totalmente carbonizado.
O MEU herói, exausto, todo suado, ainda tinha a paciência suficiente para acalmar os passageiros e o piloto, que assustados, não sabiam o que fazer.
COM TODO esse esforço, ainda houve um óbito. Um senhor de idade, de João Pinheiro que, coincidentemente, tinha assinatura de Pinheiro, salvo engano, Chico Pinheiro, veio a falecer no local. Uma moça, por sinal muito bonita, teve um corte profundo em uma das suas coxas, mas não teve maiores problemas no momento.
O TEMPO passou. Mudamos pra Unaí. Por lá vivemos alguns anos e depois retornamos pra Vazante, no mesmo ano da sua emancipação política. Meu pai estabeleceu-se com farmácia na já agora cidade de Vazante e eu por aqui permaneci, a despeito de mais tarde meu pai e meus irmãos retornarem novamente para Unaí.
A FAÇANHA daquele homem jamais se afastou da minha cabeça, o que não poderia ser diferente.
ME FORMEI advogado e fui trabalhar na Comarca de Paracatu, Jurisdição da qual pertencíamos. Mesmo antes disso, eu quando ia a Paracatu, por qualquer motivo, sempre ficava na expectativa de algum dia rever aquela pessoa, o que um belo dia aconteceu.
NO AGUARDO do horário de uma audiência, aproveitando aquele espaço, me dirigi até a praça localizada nos fundos do fórum. De repente me vi diante de um homem, o qual, apesar do grande espaço de tempo, não tive dúvidas de ser ele o meu herói, O TIM. Dele me aproximei e disparei a indagação que há muito desejava fazer:
- O senhor, porventura, é o TIM?
ELE me olhou de cima em baixo, meio desconfiado, por estar diante de um engravatado e que pra ele era um desconhecido. Ainda assim respondeu:
- Sim. Sou eu mesmo.
EVIDENTEMENTE ele estava bem mudado. Apesar de ser um homem bem amorenado, desses que envelhecem menor rápido, mas já tinha entradas acentuadas, porem com uma basta cabeleira esbranquiçada. Barbas por fazer.
ENTÃO entabulei o assunto. Era ele mesmo o meu herói. Morava ali nas imediações do Fórum, na rua que desce para a Escola Afonso Arinos, a meia distância entre o Fórum e aquele educandário.
REVIVEMOS aqueles momentos trágicos, quando ele teve oportunidade de me esclarecer algumas dúvidas que ainda me restavam. Ele sabia o nome das pessoas que estariam naquele voo. Guardava até mesmo a data do acontecido.
INDAGUEI do meu herói se as autoridades paracatuenses haviam reconhecido por alguma forma aquele seu ato de heroísmo? Se alguém já o havia procurado para uma entrevista, uma gravação de algum vídeo, etc., para resguardar esse acontecimento ímpar, não só na sua vida, como na vida das pessoas envolvidas naquele trágico acidente? Para a minha decepção ele me informou que nunca o haviam procurado pra nada em relação aquele acontecimento. Segundo ele, pouquíssimas pessoas tinham lembranças daquele dia.
NAQUELA época tinha uma TV que cobria a cidade com as notícias locais. Procurei o responsável e a ele dei a ideia de fazer um documentário sobre esse acontecimento, do que nunca tive qualquer notícia.
PASSADO algum tempo fiquei sabendo do falecimento do TIM, cujo nome não sei declinar, mas para mim ele é e será o meu ETERNO HEROI!!!
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