JOÃO SEABRA e BALTAZAR CURIANGO, VELHOS GUERREIROS...
Hoje
transitamos pelas rodovias asfaltadas e relativamente conservadas, nos ligando
as cidades próximas e, por consequência, às capitais, federal e estadual. As
pessoas mais novas, principalmente aquelas nascidas a vinte, trinta anos atrás,
não tem a menor ideia do que enfrentávamos para nos deslocar-nos mesmos
trajetos retro mencionados. E, mais ainda, quando retrocedemos há uns quarenta,
cinquenta anos, então... Nem é bom de lembrar. Quando você diz que uma viagem
de Vazante a Patos, Paracatu, ou Coromandel – cidades equidistantes de Vazante
-, a gente levava um mínimo de quatro horas, pode levar a pecha de mentiroso.
Mas, tem ainda de considerar os imprevistos, que poderiam atrasar bem mais a
viagem.
O
que seriam esses imprevistos. Principalmente no período chuvoso, era muito
comum você encontrar algum outro herói caminhoneiro com seu caminhão atolado
até os eixos, sendo arrastadas por umas quatro juntas de bois, cedidos por um
bondoso fazendeiro sediado na margem da rodovia. Podia também se deparar com
uma ponte quebrada e, como recurso, algum desvio ali próximo, tendo às vezes
que fazer um longo percurso para ganhar novamente a estrada rodageira, como era
chamada.
Há
de ser relembrado que bem antes disso o Adolfo já fazia esse percurso, que era
bem mais prolongado. Saia de Coromandel e ia até o Paracatu. Era praticamente
um dia de viagem naquelas péssimas estradas sem nenhuma manutenção.
O
usuário não tinha alternativa. Ou enfrentava essa condução ou ficava sem
viajar. Foram longos anos que o João Seabra enfrentou essas dificuldades
transportando os passageiros com as suas galinhas, papagaios e até porcos,
segundo ele dizia.
Mais adiante, com os tropeços da vida, o casal
veio a se separar e João Seabra conviveu
por longos anos com a sua segunda companheira, Ironides Pereira dos Santos, a
Nega, com quem conviveu até o dia que deus o levou.
Baltazar
José de Souza, mais conhecido por Baltazar curiango. Nascido na cidade de Patos
de Minas, veio pra Vazante, em 1.971. Aqui se casou com Fátima Maria Cavalcante
e tiveram um casal de filhos, Emerson Cavalcante de Souza e Angélica Celuta
Cavalcante de Souza. A sua esposa é filha do primeiro prefeito de vazante, Valdemar Cavalcante, o querido, Glofo.
Enfrentou,
também, uma dificuldade extrema, porém em outra linha de transportes. Ele
conduzia caminhões de minério da Cia. Mineira de metais para Três Marias,
passando pelas mesmas dificuldades de estradas de terras malconservadas, com os
mesmos atoleiros e obstáculos, transportando pesadas cargas de minério de
zinco.
Inexistia
asfalto antes de ganhar a BR 040. Inicialmente tinha de passar por Paracatu,
dali trafegar pela BR, passando próxima a margem esquerda do rio escuro,
deixando na outra margem o município de Vazante. Daí a João Pinheiro e o
destino final da carga, Três Marias. Esse percurso era de aproximadamente
trezentos e cinquenta quilômetros. Diminuía alguma coisa ao retornar, passando
por Lagoa Grande, por uma estradinha municipal. Alguns anos depois, nos idos de 1.974/75, no
excepcional mandato do prefeito Hélio Pereira Guimarães, quando conseguimos
implantar a LMG 706, e a construção da ponte sobre o Rio Escuro, a distância
foi suprimida em setenta quilômetros, ficando em torno de duzentos e oitenta
quilômetros;
Mas
o que importa é que o Baltazar curiango fazia esse trajeto de ida e volta todos
os dias da semana. Conforme o jargão dos caminhoneiros, “ele dormia carregado”
e saia de madrugada, retornando à tarde até a empresa, onde tornava a carregar.
Isso durou cerca de uns trinta anos consecutivos, até se aposentar. Duvido que
nos dias de hoje, mesmo com as estradas asfaltadas, ainda tenha quem consiga
essa façanha por tanto tempo.
A
jornada do João Seabra era menos solitária.
O
caminhoneiro tem uma jornada muito só, mas o curiango se acostumou tanto que
nunca reclamou. Naturalmente que ele tem muitas passagens interessantes nesse
incessante vai e vem, mas ele é uma pessoa introvertida, pouca conversa. Se
teve guardou para si. Mas eu, particularmente, admiro muito o feito desse
guerreiro, pois não é fácil e nem é para qualquer vivente o que ele enfrentou e
conseguiu fazer nessas décadas no volante do seu possante.
João
Seabra viveu momentos muito interessantes nas suas idas e vindas, mas a que
mais lhe marcou foi o dia em que uma senhora foi embarcar na sua jardineira,
num dos pontos de parada do meio rural. Era ela e uma moça, que depois veio, a
saber, ser sua filha.
Era
muito comum as pessoas desacostumadas com as viagens, como diziam, em carro de
gasolina, sofrerem perturbações estomacais, culminando com vomitações e aquele
desconforto posterior. Suor frio, languidez do corpo e até mesmo um sono
profundo.
Mas
naquele dia as duas embarcaram e a jardineira tinha rompido uns poucos
quilômetros e a moça já começou a dar vômitos e não teve jeito, vomitou
bastante. E, quando o passageiro começava a passar mal dos vômitos, se não
interrompesse, o motorista calmamente parava a jardineira e procurava dar algum
tipo de socorro.
O
João Seabra , preocupado com aquele estado da moça, freou o carro, estacionou e
indagou da senhora sua mãe: -foi comida?
Se referindo a alguma comida que tenha
lhe causado alguma indisposição estomacal.
A
mulher respondeu rispidamente: - foi. Mas ocê não tem nada com isso não. Ela
vai casar... Tô indo pra cidade mode tirar os nomes!...
Ele
entendeu na hora. Daí a alguns meses, casada ou não a criança deve de ter vindo
ao mundo...
João
Seabra, meu grande amigo, deus levou...
Baltazar
José de Souza está entre nós, gozando da sua aposentadoria e se escondendo do
coronavirus...
Não
sei qual dos dois merece a estátua maior...
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